terça-feira, 27 de outubro de 2015

Sonho possível

Eu percebi.
Quando fechei a porta de vidro, olhando para ele com os olhos ainda cheios de sono e mandei aquele beijo soprado na palma da mão, ainda meio indecisa em entrar, eu percebi que algo realmente não estava bem.
Aquele pequeno momento, em que os seus olhos meio baixos mostraram a tristeza, nada condiziam com as horas anteriores entre papos, risos e carinhos. Era tarde da noite, eu estava cansada, mas queria poder passar mais alguns minutos ao seu lado.
Droga! Pra que tanto pensar, se a vida é tão simples? Mas eu vivo e morro em segundos, amo e sofro em fração de segundos.
Eu poderia escrever um roteiro de novela com a nossa história, sem fantasiar, apenas contando os fatos mais verdadeiros e ainda assim o telespectador pensaria consigo: "isso só acontece em novela!"
Mas, não! É a vida real e as vezes ela é cruel, dura e insensível, ou somos apenas nós que não nos deixamos levar pela beleza das pequenas coisas, querendo tudo diferente do que é, sempre querendo algo além, por melhor que tudo esteja. Acho que é a nossa natureza humana sempre insatisfeita, como o Lobo da Estepe, aquela eterna luta entre o homem e o lobo, nunca satisfazendo a um ou a outro, quando um tem que se calar para que o outro exista. Terei eu a loucura que penso ou serei eu a loucura que os outros veem em mim?
Sai do elevador, caminhei ate o meu quarto ainda pensando se não devia descer correndo e ir até ele, e dizer o quanto ainda é importante pra mim, o quanto nosso planos são definitivos e concretos. Mas, pra onde vão os planos e sonhos quando já não acreditamos tanto neles como quando estamos felizes?
Eu quis abrir a janela e gritar pra que voltasse, que falássemos mais um pouco sobre nós ou somente sentir seu abraço quente me envolvendo. Mas não fiz. Apenas arrumei minhas coisas e deitei calada. Fiz minha pequena oração pedindo a deus e ao tempo que tudo cure.
Mas, coitado do tempo, à quem delegamos tamanha responsabilidade por aquilo que não temos coragem de resolver na hora certa.
Antes de adormecer ainda quis ligar, dizer um "eu te amo" com a voz em sussurro, porque ele costumava dizer nas vezes em que estávamos colados e falando bem baixinho que quando os corações estão próximos não é preciso gritar, nem falar alto. Eles se ouvem.
Ouvi baixinho uma das musicas que ele fez pra mim, tentando me encontrar entre os versos e ver se eu ainda estava ali. Achei que sim.
Eu apenas queria esquecer, e me entregar podendo viver a plenitude das palavras e promessas que ele fizera pra mim durante todos esses dias, com melodias de uma trilha sonora cheia de paixão. Eu sei que posso, mas o medo as vezes me consome.
Fiz um sonho estranho mas feliz, em que eu estava na rua olhando distraída para as vitrines quando um menininho cheio de sardas e com o cabelinho loiro me puxou pela mão, apontando com o dedo em riste para alguém que vinha logo atrás. Ele ajeitou o cabelo e sorriu se aproximando de mim. Caminhamos os dois em silêncio junto com o menino que pulava entre nós.
Quando acordei percebi que tudo é possível.
Era um sonho possível.
- Alô - ele respondeu do outro lado da linha
- Tá livre pra jantar hoje a noite?

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